sexta-feira, 7 de agosto de 2009

(Pra lá de) Marrakech

Sempre quis conhecer o Marrocos, em especial a cidade de Marrakech. Não sei explicar exatamente porquê, me despertava uma curiosidade de descobrir um lugar que parecia diferente de todos que eu havia visitado, com costumes e paisagens novas, desconhecidas...
E a verdade é que Marrakech me encantou! Com todas as suas muitas cores, sua gente e seus animais, seus sons e seu movimento peculiar nos envolvem de uma maneira que é difícil escapar.

Logo ao chegar, depois de uma curva digna de esquadrilha da fumaça desempenhada pelo piloto do avião, me deparei com a primeira antítese da cidade: um aeroporto todo moderno e reformado por dentro, mas com a menor pista de pouso que eu já tinha visto na vida. Ao sair do aeroporto, começa a nossa vivência com a cultura marroquina: literalmente meia hora para definir um preço com os muitos taxistas que têm seus chevetes bege enfileirados e dão pitacos hora em árabe entre eles, hora em inglês conosco. Como toda definição de preços no país, acabamos por chegar num acordo que era menos da metade do valor pedido inicialmente; aliás, isso é muito próprio da cultura nacional, em que praticamente nenhuma mercadoria tem preço fixo e pechinchar é quase uma arte. E jamais entre num táxi sem definir preço antes, senão no fim da corrida o motorista se vê no direito de cobrar o quanto lhe dê na telha (taxímetro é apenas uma lenda por ali).

Fiquei hospedada do lado de fora da Medina, a cidade antiga, mas praticamente ao lado de uma de suas muitas portas. Ela é cercada por uma muralha, e abriga a Mesquita de Kutubia, onde só muçulmanos do sexo masculino podem entrar. A propósito, outro pequeno choque cultural foi ter que convencer a mim mesma, brasileira falante e sorridente, de que não se deve olhar nos olhos e muito menos sorrir para os homens - principalmente estando sem uma companhia masculina ao lado. Aliás, esse foi o único aspecto negativo da viagem: o homem marroquino em geral tem uma visão preconceituosa com relação às mulheres ocidentais (que muitas vezes também abusam de decotes e shortinhos em um país onde qualquer ser do sexo feminino anda coberto literalmente dos pés a cabeça), e olham muito e falam muito com mulheres desacompanhadas... Mas nada que discrição, um ar de não-ouço-não-falo-não-vejo e um pouco de paciência não superem.

Para mim, o encanto de Marrakech está na Medina - até fui conhecer Palmeraie, a área moderna, mas a profusão de hotéis e clubes excessivamente estrelados e seus campos de golfe descaracteriza a cidade. O gostoso é andar em meio às muitas pessoas, charretes, motos e bicicletas nas ruas da Medina para chegar no coração do lugar, a praça Jeema el-Fna, movimentadada a qualquer hora do dia, com seus incontáveis vendedores de frutas secas, suco de laranja, tatuadoras de henna, macacos amestrados e encantadores de serpentes, misturando em um só bloco nativos e turistas. Ao pôr-do-sol, agregam-se também uma incrível quantidade de barraquinhas-restaurante, que oferecem iguarias que vão desde caracóis fervidos a sanduíches de praticamente tudo.
A praça é também a entrada para os souks, mercados de produtos, normalmente divididos de acordo com o que vendem: há o souk de tapeçaria, o de roupas, o de coisas para casa etc. E há também aqueles que têm de tudo um pouco, formando um labirinto que num primeiro momento parece impossível de se orientar, mas com o passar dos dias acabamos por usar como referência o que vemos no caminho (desde vendinhas, cafés, produtos expostos ou até um velho sentado, já que muita coisa parece nunca mudar de lugar) e acabamos por encontrar o destino buscado, ainda que por caminhos errantes. Os souks também são capazes de encher os olhos com tantas cores e variedades de produtos, mas o ideal é só demonstrar interesse por aquilo que você realmente pretende comprar - e aí começa de novo a batalha de meia hora para definição de preço já experimentada com o motorista de taxi. O engraçado é que, seja o preço que for (um pouquinho acima do que o comprador ofereceu e bem abaixo do que o vendedor pediu), as duas partes sempre terminam contentes o processo de venda... talvez seja por isso que a barganha continue rolando solta por essas bandas.

Durante o dia, a Medina está cheia de boas opções para comer pratos típicos, como um bom cuscuz marroquino (que nos faz nunca mais ter vontade de comer aquilo que chamamos pelo mesmo nome no Brasil), e também locais cuja higiene é mais duvidosa, que no entanto são muito disputados pelos nativos. Também é impossível ir sem provar o conhecido chá de menta, que normalmente é servido com muito charme em chaleiras fofíssimas de inox.

Para hospedagem, o que é realmente típico é estar em um Riad, que são casas tradicionais com um amplo jardim interno transformadas em pousadas, cujos quartos podem ter banheiro individual ou compartilhado, e incluir ou não o café da manhã, o que varia de acordo com cada estabelecimento. O interessante dos riads é que às vezes uma portinha despretensiosa pode esconder um pequeno palácio luminoso e ajardinado.

Marrakech é mesmo um sem fim de cores, cheiros e sabores, que só quem visitou pode saber exatemente como é. Mas, apesar das (muitas) diferenças culturais, de alguma maneira é impossível sair de lá sem uma vontade inexplicável de sempre querer voltar.